O que é ser iniciado?
Detalhe de edificação em frente ao Museu do Louvre - Paris/FR |
O termo pode ser aplicado a um domínio específico ou no
geral. Iniciar algo, em sentido genérico, pode ser começar a fazer um curso ou
aprender a ser padeiro. Em sentido mais restrito, podemos dizer que ser
“batizado” em uma Igreja Cristã ou outra tradição religiosa se trate de um ato
de iniciação.
Porém, o termo tem tomado o sentido de ser alguém entendido
em assuntos esotéricos. Mesmo o batizado das Igrejas Cristãs, talvez por ser a
religião hegemônica, não carrega a ideia de iniciado.
Em termos religiosos, não apenas esotéricos, iniciar-se ou
ser iniciado é um estado pessoal. Uma condição espiritual que faz da pessoa
iniciada um participante de uma realidade distinta da realidade dos demais
seres humanos. É como se o iniciado participasse de uma realidade, existisse em
uma realidade que pessoas não-iniciadas, mesmo estando fisicamente ao lado do
iniciado, não participam.
Existe duas possibilidades de pensar a Iniciação. Uma do
ponto de vista da pessoa que é Iniciada. Outro forma de ver esse “fenômeno” ou
“estado de espírito” é do ponto de vista das ciências da religião.
Para os interessados no assunto pode-se dizer que há dois
caminho. a) Teologia e b) Ciências da Religião.
a)
A Teologia é o caminho do “crente” da pessoa que
pretende estudar os assuntos vinculados à experiência religiosa e fazer a
experiência. Portanto há um comprometimento em viver o que se estuda.
b)
As Ciências da Religião procura estudar o
fenômeno religioso sem o compromisso do pesquisador em ser um “crente”. O
Cientista da Religião é um home de pesquisa e não um “crente”.
O assunto da mística pode ser tratado pelos dois campos de
pesquisa. Em geral são os místicos os primeiros a escreverem sobre seus estados
espirituais. O que é complexo, pois o místico pode participar de estados de
espírito que são profundamente diferentes de tudo que vivemos no dia-a-dia.
Escrever para as pessoas simples, portanto, é um grande problema. Em última
instância não é possível dizer sobre algumas realidades se as pessoas vivem em
outra.
Por esse ponto, os místico sempre foram vistos de modo
desconfiado.
2 – Estado Espiritual
versus Fenômeno Espiritual
Em Filosofia fenômeno é aquilo que toca a sensibilidade.
Sensibilidade é todos os nossos sentidos. Olhos (visão), narinas(olfato),
ouvidos(audição) , paladar(gosto) e tato (volume).
Estado Espiritual seria outra coisa. Seria como se a pessoa
conseguisse chegar a conhecer algumas coisas sem passar pelo caminho dos
sentidos. Os sentidos sempre precisam de alguma elemento que o toque. Esses
elementos que aparecem aos sentidos são chamados de fenômeno. Os elemento que
não nos apresenta recebe o nome de
“coisa em si”. A coisa em si nunca se apresenta à nossa consciência,
apenas desconfiamos da existência dela.
3 Experiência mística:
uma contradição
Falar em iniciação é o mesmo que dizer de mística.
Considerando a definição acima sobre fenômeno e estado místico, não se pode
falar de experiência mística, pois toda experiência passa pelos sentidos. O que
ocorre com o iniciado ou místico excede isso. O místico parece cortar o caminho e acessar
diretamente outras realidades sem fazer uso dos sentidos, como todos nós temos
de fazer.
Nesse sentido iremos encontrar pessoas que sem explicação
faz coisas fora do “normal”. Jacob
Boheme, um místico medieval da Alemanha, era sapateiro, mas escreveu várias
obras místicas. Observando a vida dele e os livros parece ser algo impossível
de ser.
4 . Os tipos de
místicos
Os místicos ou iniciados utilizam de linguagens muito
complexas. Parece que cada místico funda uma nova linguagem. Segundo um
renomado pesquisador da mística judaica, Gerson Sholem, existem místicos que
preferem-se se isolar. Deixar o convívio dos humanos, pois a tarefa de tradução
é profundamente enfadonha para o iniciado.
Para outros, entre eles Jesus Cristo, o fenômeno da
iniciação é um chamado a revolucionar a vida dos demais humano.
5. A iniciação.
Infelizmente não há como “iniciar alguém”. Essa é a grande
verdade das iniciações propiciada pelas instituições. Seja na Maçonaria ou na
Igreja Católica a ideia do ritual de iniciação (batizado) é uma ação simbólica
que procura propiciar as condições para que a pessoa possa em seguida agir ou
se colocar no estado de iniciado.
A Igreja Católica elabora uma teologia que pretende fazer
algo. Pelo gesto do padre a Igreja diz executar uma ação que impõe ao outro um estado
de espírito. Nesse sentido o padre tem um poder mágico e que a Igreja advoga
ser fruto da seguinte cena. Jesus “ordenou” os apóstolos. Jesus é o próprio
Deus. Dos profetas ao padre houve uma sucessão de imposição de “mãos” até
chegar ao padre que acaba de efetuar o batizado. Denomina a isso de
“apostólico” ou sucessório. Nesse contexto é como se o próprio Jesus Cristo
estivesse impondo as mãos sobre a criança.
Essa cena é discutível nos dias de hoje. Outrora,
especialmente na Idade Média, discutir esse fato era pedir para ser morto por
heresia.
Na Maçonaria a iniciação é simbólica, ainda que carregada da
lógica “apostólica” da Igreja Romana.
Por iniciação simbólica assume-se que apenas se propicia
parte do processo à pessoa que deseja ser iniciada. O restante cabe à pessoa
completar. Pode-se criar as condições, mas não dá para fazer algo que só cada
um pode fazer.
É como se comprássemos o caderno e o lápis. Arrumássemos o
lugar, mas não conseguimos fazer a pessoa ser alfabetizada, somente ela é capaz
de se tornar alguém que sabe escrever.
6 Os instrumentos
para se iniciar
A
auto iniciação é um tema complexo. Especialmente em épocas que iniciação virou
uma fonte de ganhar dinheiro. Geralmente a iniciação se dá em uma comunidade e
nunca só, pois será no convívio fraterno e no desafio da vida comunitária que
iremos fazer outro tipo de experiência humana. Um tipo de experiência humana
mais completa ou significada de um ponto de vista nunca tematizado.
Ser
iniciado não é negar a condição de humano, ao contrário, é encontrar uma faceta
do humano que o justifique e exalte a sua importância. A iniciação,
portanto, não é uma patologia do tipo
“síndrome do pânico”, mas um novo olhar sobre a condição humana. É uma
“revelação” ou “encontro” de uma nova verdade que diz da importância e do
caráter impreterível da condição humana.
Mas
na cultura de massa e de consumo sempre é um problema a vida em comunidade.
Viver nos moldes de hoje pode ser um deserto. No metrô de qualquer parte do
mundo não encontramos pessoas, mas um outro indefinido que perde a própria
condição de Outro enquanto humano.
Algumas
comunidades, como os Essênios, os Quaker, os Amsher, a Maçonaria, etc, procuram
construir essa comunidade em vistas de criar o espaço necessário para se levar
uma vida de iniciado. Não se quer criar uma comunidade de melhores, mas apenas
e tão somente uma comunidade de fato e não mero aglomerado no qual o indivíduo
desaparece.
A
comunidade nesse sentido constitui um instrumento importante na vida de quem
pretende ser um iniciado.
O
próximo elemento é o número três (3).
Sem muito alarde, três é um número muito corrente nas tradições esotéricas. O
sentido do número três se dá quando tomando como representante de três
situações.
Em
geral, dentro do que chamamos cultura de massa ou da televisão, as pessoas não
conseguem pensar nada que seja complicado. A esse modo simplista dizemos uma
expressão popular: “é oito ou oitenta”, isto é, as pessoas simples pensam de
modo simplista e os fatos só podem ser de dois modos. O número dois (2) nesse sentido é tenebroso,
pois quem pensa apenas de forma binária deixa de ver muita coisa da realidade.
Para o povo um fato só pode ser bom ou mal. Não se consegue ir mais além, ver a
complexidade do presente. Verificar que “esse fato” é fruto de muitos outros ao
longo do tempo.
Um
exemplo banal é verificado nas chuvas e cheias provocadas pelos rios. As vezes
as pessoas recebem uma noticia que na parte do rio que fica acima de sua casa
houve uma cheia com elevação x do rio. O pobre abaixo teria condições de se
retirar antes que as águas do rio suba, mas ele só consegue agir quando vê no
presente as águas entrando dentro de sua casa.
7 O número três
O número três é o número do iniciado não por esconder uma
magia ou poder fora do alcance do humano. Trata-se apenas de uma capacidade de
olhar a realidade e se colocar nela. É preciso compreender que qualquer assunto
precisa ser pensado sob três aspectos.
Se quero levar uma vida de iniciado devo fazer algumas
perguntas que considerem três aspectos.
a) Quem sou? (escrever
a própria história em um caderno, narrando desde o momento que se lembre é um
ótimo exercício.)
b) Quem quero ser? (Como os tempos mudam, cabe a cada pessoa articular o que ela quer ser;
espero dedicar um texto só sobre esse tema.)
c) Como faço para ser o quero ser? ( Estudar é uma parte da estratégia; estudos não garantem
tudo; é preciso ser alguém político; é preciso fazer política;)
Para trabalhar a) Quem
sou? o melhor é procurar um analista, pois se trata de um
profissional apropriado e se espera dele auxilio para que possamos compreender
a complexidade que é nossa constituição psíquica.
Quem quero ser
pode ser trabalhado de várias formas e contar com a participação de
profissionais que se destinam a fazer orientação profissional ou outras
profissionais de “conting profissional”.
Como faço para ser o
quero ser cabe à própria pessoa que deve se articular com outras que podem
somar forças em algum projeto comum. É onde aparece as comunidades e seus
desafios de vida comunitária. Em alguns casos, a vida comunitária perde seu
foco inicial, sendo melhor a pessoa seguir seu caminho solitariamente ou a
procura de outra comunidade.
8 O erro básico dos
postulantes
Muitos desejam muito ser algo. Foca a atenção no “quem quero
ser” e ignoram o ponto “a” e “b”.
O ponto mais fundamental é conhecer a si. Desse ponto é que se tem condições de pensar as estratégias para criar as condições necessárias a quem desejo ser.
9. Considerações
finais
A paciência e o trabalho sobre si constituem o passo que irá
determinar se a pessoa é uma iniciada ou não. Muitos “iniciados” institucionais
nunca serão iniciados, pois após passar por um ritual de iniciação irão se
contentar em participar de atividades sociais ou litúrgicas. Irão continuar a
ver as coisas como sempre, e jamais irão captar a essências das coisas. Serão
eternos consumidores de modas esotéricas e estarão sempre atrás do guru da
moda.
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